A classe média portuguesa foi ganhando foros de cidadania durante o Estado Novo, e, embora pobre, por enquanto, chegou a corporizar o regime de Oliveira Salazar. Já nos idos do Marcelismo, a classe média adquiriu alguma pujança económica, social e política. Que perdeu, parcial e momentaneamente, com a Revolução do 25 de Abril de 1974, e, em particular, no decurso do PREC. Os ventos sopravam agora a favor do proletariado e do campesinato, que ainda existiam, e no ideário do slogan POVO/MFA, defendido e apregoado pelo PCP, e os partidos à sua esquerda, não estava propriamente incluída a classe média. Portanto, e para se defender das investidas revolucionárias, a classe média refugiou-se no Partido Socialista, do Dr. Mário Soares, e no Partido Popular Democrático, do Dr. Sá Carneiro. Em tais posições, que eram o seu espaço sócio-político natural, a classe média resistiu pacífica e tenazmente, aguardando que os ventos mudassem.
E de facto mudaram, com o contragolpe do 25 de Novembro de 1975, e com Ramalho Eanes, no comando das Forças Armadas. Este general mandou as tropas para os quartéis, e os manifestantes para casa. O arraial já durava tempo de mais, e tornava-se assaz ruidoso para os nosos brandos e pacatos costumes. De resto, uma revolução popular não era coisa que, por essa época, estivesse nos planos dos portugueses. Resumindo: a classe média suspirou de alívio.
Desde então, e dentro da normalidade, que é vocação última da classe média, esta passou a ganhar nas urnas o que havia perdido nas ruas, nas paradas e nos comícios. E, duas ou três eleições depois, a classe média já dominava por completo o aparelho do Estado, que é o seu último refúgio, e até aos nossos dias, o PS e o PSD, que são os partidos da classe média, por excelência, revezaram-se nos governos. Ou seja, a classe média estava de corpo inteiro no poder, e, nessas condições, ela tinha de fazer pela vida. Tinha de governar e de se governar, colocando, para tanto, nos vários lemes do País, os seus lídimos representantes do PS ou do PSD. E foi assim que, nos últimos 20 anos de governação alternada destes dois partidos, a classe média conheceu os seus momentos de glória. Pelas cortesias, pelas regalias e palas mordomias. Que foram sendo distribuídas, com profusão e cópia, aos funcionários públicos, aos gestores, aos bancários e, por grosso, aos quadros e técnicos. Tudo visto, à vanguarda da classe média portuguesa.
Fortemente escorados nos fundos comunitários, que jorraram no País, a partir dos finais da década de 1980, e aproveitando ou promovendo o crédito fácil, barato e ilusório, o PS e o PSD tudo fizeram, e não fizeram, para dignificar, enriquecer e fortalecer a classe média em geral. E o mais do que tudo foi, no dizer do ex-Ministro das Finanças, Dr. Miguel Cadilhe, o monstro que Cavaco Silva criou. Isto é, a reestruturação das carreiras da Função Pública, que, de um dia para o outro, deixou meio mundo rico. Daí em diante, o céu era o limite: primeiras e segundas casas, 2 e 3 automóveis por família, férias em destinos exóticos, cruzeiros, computadores, Plasmas, e telemóveis para todos os gostos, financiamento para consumo privado, etc, etc, etc,. Pode dizer-se com alguma dose de certeza que a classe média nunca viveu tão bem como nos 20 anos compreendidos entre 1990 e 2010. Foram os melhores anos da sua vida.
Só que a prosperidade era falsa. O dinheiro não resultava do nosso crescimento económico, que aliás foi módico no citado período. Fizemos a festa com o dinheiro dos outros. O dinheiro era sobretudo emprestado, e, mais dia menos dia, a conta havia de chegar.
A ascenção, alegre e triunfal, da classe média portuguesa começou com um dirigente social-democrata, Aníbal Cavaco Silva. O declínio, lúgubre e sombrio, da mesma classe começou com um outro dirigente social-democrata, Pedro Passos Coelho. Depois da fartura, veio a factura, e o mais é história que se conhece.
José Sócrates foi, nos últimos anos, o Primeiro-Ministro mais violentamente atacado pela comunicação social portuguesa. E, na sanha persecutória, desencadeada contra o antigo governante socialista, e que em grande medida conduziu à sua queda, destacaram-se, em certo sentido provavelmente com razão, pela insistência e pela virulência, os seguintes cinco jornalistas: José Manuel Fernandes, Manuela Moura Guedes, José António Saraiva, Vasco Pulido Valente e Mário Crespo. A ordem é aleatória e não se pretende fazer aqui a análise das razões, políticas e ideológicas (se calhar atendíveis) subjacentes a tal perseguição. O espaço seria insuficiente, e, por isso, vamo-nos ater apenas a um deles: Mário Crespo, que, há coisa de dias, foi o centro de mais um conflito jornalístico. Desta feita, despediram-no sumariamente do Expresso, por falta de ética e de respeito para com a Direcção do mesmo jornal. Dito de outra maneira: na sua última crónica, publicada no semanário em questão, não se coibiu de ser menos elegante para com os colegas que o haviam convidado, segundo consta, a peso de oiro, para ser mais um deles. Em tal emergência, só uma porta se abria a Mário Crespo: a da rua.
Mas quem é Mário Crespo? Mário Crespo é um retornado de Moçambique, nascido em Coimbra. Logo a seguir à independência desse ex-território português do Índico, escapuliu para a África do Sul e aí viveu algum tempo. O período era ainda do famigerado Apartheid. Pormenor não despiciendo: antes, e no cumprimento do serviço militar, fora assessor de imprensa do General Kaúlza de Arriaga, então Comandante em Chefe das Forças Armadas portuguesas estacionadas na mesma colónia.
De regresso a Portugal, Mário Crespo integrou os quadros da RTP, da qual foi correspondente em Washington. Deixou o canal público, em termos não muito pacíficos, apesar de uma rescisão do contrato de trabalho por alegado mútuo acordo. O certo é que, a partir daí, a RTP é um tema recorrente das amargas recordações de Mário Crespo, e, porventura, também o contrário.
Entretanto, aparece na SIC Notícias, como pivot do Jornal das Nove,e, nessa qualidade, o alvo das suas atenções foi, como sempre, José Sócrates e os seus executivos. Em paralelo, continuou nessa senda, através do programa Plano Inclinado, onde teve como convidados os insuspeitos Medina Carreira, João Duque e Nuno Crato.
Um artigo, de ataque contundente, para variar, ao então Primeiro-Ministro José Sócrates, que a Direcção do Jornal de Notícias recusou publicar, ditou o seu afastamento deste Diário da capital nortenha.
Mário Crespo é um exemplo claro de alguém que quer ser político, jornalista e protagonista. Tudo ao mesmo tempo. Mário Crespo parece acreditar que a Esquerda é responsável pelas desgraças, pessoais e profissionais, que lhe aconteceram na vida, desde o 25 de Abril de 1974. Por isso, Mário Crespo parece ser alguém que só quer ajustar contas com a Esquerda, servindo-se, para o efeito, dos vários púlpitos jornalísticos que generosamente lhe têm vindo a oferecer. O seu conflito com a Direcção do Expresso não é propriamente uma surpresa.
É o corpo eléctrico e nimboso que dispara fagulhas douradas por todos os poros. É a luz que brilha mais forte no meio de outras luzes. É a boneca, alada e vaidosa, que foge para o voo, pensando na mana. O resto, além do paleio entre doutores, é tudo adereços fortuitos. Os brincos enormes que pendem pesados. O salto impiedoso que fere a alcatifa, sem esquecer a objectiva. Os anéis volumosos e voluptuosos, que, em planos grandíssimos, desafiam as câmaras e a enorme plateia. O trapo do último grito, que suscita a inveja mais a cobiça. Tudo à medida dos seus desejos e caprichos, escritos no guião contratual previamente estudado. É a primeira entre iguais. Nas conversas, da parte dela, nem entrevistas nem dúvidas. São opiniões, informações, sentenças e respostas. E depois, é só sentir o efeito e a ressonância das suas próprias e sábias palavras. Puxa, repuxa e entorta os lábios, com destaque para o superior, que a cosmética cirúrgica inchou e o bâton da moda acentuou. Observa à direita e à esquerda. Ora para o residente, ora para o convidado. Os olhos, esses, não param. Pudera, também comem! Mesmo quando uns óculos soberbos, em momentos de desenfado e em leituras fugazes, provocam o espanto. Afinal precisa de próteses! Só lhe faltam as sarnas. É o espectáculo da noite em hora de ponta. Por pouco seria uma stand up comedian e talvez venha a sê-lo. A resposta milionária à concorrência feroz. Vem de outros tempos e de outros senhores. Ser estrela é o seu destino e a sua tragédia. No fim, e para a surpresa de todos, tem poderes ocultos que confessa orgulhosa à imprensa sedenta. Derruba ministros e faz cair gabinetes, em questão de minutos. Temos diva e magia. Temos Maquiavel e Mulher. Temos olhos nos olhos!
. CORRENTE DE CONSCIÊNCIA -...
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